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Desconstruindo Estigmas: Uma Perspectiva Pouco Falada sobre a Migração Venezuelana

  • Foto do escritor: Casa Venezuela
    Casa Venezuela
  • 28 de out.
  • 4 min de leitura
Evento humanitário realizado pela ONG Casa Venezuela em 2021
Evento humanitário realizado pela ONG Casa Venezuela em 2021

Em tempos de desinformação e polarização, é urgente repensar a forma como enxergamos a migração. Com mais de 9 milhões de venezuelanos vivendo fora do país, esse movimento tem gerado impactos sociais e econômicos significativos nos países de acolhida.


Infelizmente, as manchetes mais populares muitas vezes adotam um tom sensacionalista, focado em gerar visualizações e capitalizar sobre o medo. Muitos desses artigos — especialmente nos Estados Unidos, influenciados por tendências políticas — destacam temas como o “Tren de Aragua”, a migração ilegal e a suposta chegada de pessoas violentas ou que “não contribuem” com o país, mas recebem benefícios pagos pelos contribuintes.

Como alguém que estuda o tema migratório há anos — e que também é um migrante venezuelano vivendo no exterior — reconheço que essa realidade pode ser desconfortável de encarar. No entanto, para termos uma visão coerente sobre a migração, não basta focar apenas nas histórias negativas. É preciso analisar o fenômeno como um todo — o bom e o ruim — e entender que, ao olhar para os dados e para a realidade concreta, a grande maioria dos migrantes não representa um peso social ou econômico, mas sim uma força de transformação.


Nos últimos anos, o Brasil tem se tornado um dos principais destinos para venezuelanos em busca de uma vida mais digna. A proximidade geográfica, a cultura acolhedora e as políticas públicas voltadas à recepção humanitária fizeram do país uma alternativa viável para milhares de famílias que fugiam da crise. Desde 2017, o fluxo migratório aumentou significativamente, com a entrada de centenas de milhares de venezuelanos pelas fronteiras do norte, especialmente em Roraima. Muitos chegam com esperança, buscando trabalho, educação e segurança — e encontram no Brasil uma chance real de recomeço.


Apesar das dificuldades enfrentadas, milhares de venezuelanos têm encontrado no Brasil uma oportunidade real de reconstruir suas vidas com dignidade. A Operação Acolhida, coordenada pelo Governo Federal em parceria com a ONU e diversas organizações da sociedade civil, já interiorizou mais de 50 mil migrantes para cidades em todo o país. Essa estratégia tem gerado impactos positivos não apenas para os migrantes, mas também para as comunidades que os recebem — promovendo diversidade cultural, inclusão social e força de trabalho qualificada. Histórias como a de Ronalid Rodriguez, que conseguiu recomeçar a vida com sua família em Mato Grosso, mostram como a migração pode ser uma ponte para o desenvolvimento humano e econômico. (Leia mais sobre essas histórias aqui)


Ronalid Angele Rodriguez, de 21 anos, mãe de três filhos: recomeço no Brasil. Foto: Ricardo Roger/Min. Cidadadania
Ronalid Angele Rodriguez, de 21 anos, mãe de três filhos: recomeço no Brasil. Foto: Ricardo Roger/Min. Cidadadania

Outro exemplo inspirador vem de Brasília, onde dezenas de venezuelanos foram contratados por redes de fast-food e iniciaram uma nova jornada profissional e familiar. A história de Alfonzo de Jesus Rodrigues, que chegou ao Brasil aos 63 anos e conseguiu reunir parte da família após anos de separação, é um retrato da resiliência e da contribuição dos migrantes. Seu sobrinho e filho, ambos jovens, foram contratados e hoje ajudam a sustentar a família, enquanto planejam trazer outros parentes para o país. Esses casos mostram que, com apoio institucional e oportunidades reais, os migrantes não apenas se integram — eles revitalizam comunidades, movimentam a economia e constroem novas histórias de sucesso. (Veja mais sobre essa trajetória aqui)



Claro, isso só é possível quando a migração é bem estruturada. E para isso, três pilares são fundamentais: legalidade, integração e autonomia.


  1. Legalidade: Migrar legalmente é essencial. Respeitar as leis do país anfitrião não é apenas uma obrigação, mas também um caminho para garantir direitos e oportunidades. A legalidade protege o migrante e fortalece a sociedade que o acolhe.


  2. Integração: A integração cultural e linguística é outro ponto crucial. Aprender o idioma local, compreender os costumes e participar da vida comunitária são formas de construir pontes. Isso não significa abandonar a própria identidade — pelo contrário, é possível preservar a essência cultural e, ao mesmo tempo, enriquecer o tecido social do país de acolhida.


  3. Responsabilidade: Estar em um novo país é um privilégio, e com ele vem a responsabilidade de contribuir. O apoio que os migrantes recebem deve ir além da ajuda humanitária emergencial. Doações de alimentos, abrigo e medicamentos são importantes, mas não podem ser a única resposta. O foco deve estar na inserção produtiva: acesso ao mercado de trabalho, capacitação profissional e educação.


  4. Ajuda Humanitaria Estrategica e Nao prolongada: A dependência prolongada de ajuda humanitária pode criar ciclos de vulnerabilidade. Por isso, é preciso investir em políticas públicas e iniciativas da sociedade civil que promovam a autonomia dos migrantes. Quando isso acontece, todos ganham: o migrante, que reconstrói sua vida com dignidade, e o país anfitrião, que se beneficia de novos talentos, ideias e força de trabalho.


Migrar é um ato de coragem. É também uma oportunidade — para quem chega e para quem acolhe. Precisamos abandonar as narrativas do medo e substituí-las por histórias de cooperação, respeito e progresso.

 
 
 

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